Agarrado ao Pára-Choques - Peixe
Esta semana um grupo de gente fardada entrou de assalto num supermercado da grande Lisboa. É uma coisa que já não causa espanto. Mas há cambiantes diferentes nesta história: a farda não era a do costume. Não era em tons escuros nem dizia ASAE, era mais a dar para o amarelo e dizia Greenpeace. Apesar das pessoas já estarem prontas a largar cestos, carrinhos e crianças de colo, e fugir para salvar as suas vida, quando perceberam que não eram os fiscais de António Nunes, ficaram bem mais descansadas. Certificaram-se apenas que eles não traziam os amigos do Movimento Verde Eufémia, que essa malta além de ser mais barulhenta e desagradável, ia querer destruir o corredor do milho e das leguminosas enlatadas de certeza. O que era uma chatice. Mas estes senhores da Greenpeace são bem mais criativos, trazem sempre instalações artísticas com vegetais, poemas sobre pequenos animais indefesos, ou então não trazem roupa, o que é à sua maneira uma forma de arte. O chamado nu artístico. Desta vez decidiram distribuir folhetos em forma de peixe, com a lista das espécies pouco sustentáveis. Isto porque os portugueses são dos maiores consumidores de peixe da Europa. Como se já não bastasse termos de ter cuidado com os nitrofuranos do frango, os pesticidas da fruta, a BSE das vacas ou as salmonelas dos ovos, agora os activistas pedem aos hipermercados nacionais que alterem a política de compras e incluam critérios como a taxa de crescimento e reprodução da espécie, a proveniência do peixe e o método de pesca. Perguntar à pescada como vai a vida conjugal, perguntar às douradas se os filhos estão a crescer saudáveis, investigar a proveniência do arenque, saber se tem visto de permanência ou se já é cidadão nacional, e saber como foi pescado: numa solarenga tarde de pesca desportiva ou por um pescador que furou a greve… Entre as espécies apontadas como pouco sustentáveis estão o salmão, o atum, o bacalhau, o camarão, o espadarte, o linguado, o peixe-espada, a pescada, a solha ou o tamboril. Coisa pouca portanto. Sobram-nos as sardinhas e os carapaus, o que dá jeito nesta altura do ano mas é capaz de começar a cantar. Sobretudo quando tentarmos substituir cocktail de camarão por cocktail de sardinha ou ensaiarmos uns pasteis de carapau. O slogan da Greenpeace foi “encolhe o teu peixe, não mordas o anzol”, pedindo às pessoas que reduzam o consumo destes peixes. Mas este apelo é bem capaz de ter o efeito contrário. Já se sabe como são os portugueses quando são lançados alarmes. Se uma marca de iogurtes for retirada do mercado, eles vão lá açambarcar todos, mesmo que o prazo de validade seja só de uma semana. Quando a gasolina ameaçou acabar, as filas foram de kilometros e os ânimos exaltaram-se. Já imagino estas pessoas à volta da banca do peixe, envolvidas em conflitos violentos para levarem para casa o maior stock possível de peixe. Aliás, eu tenho para mim que quando for anunciado o fim do mundo, os portugueses vão sair todos de casa num ápice, não numa tentativa desesperada de salvamento mas para serem os primeiros a chegar. Se é o derradeiro fim para todos nós, que seja, mas que sejam eles os primeiros a apanhá-lo. E esta regra é tão aplicável ao apocalipse como a postas de salmão.