Foi uma semana de apoquentações para José Sócrates, acusado a torto e a direito de atentados à liberdade por professores, sindicalistas e gente de outros partidos em geral. O primeiro-ministro reagiu à onda de protesto como sempre faz: comparecendo com um fatinho novo, cortado à medida, daqueles que fazem até um presidente americano gabar a boa forma e aspecto sempre impecável do líder do governo português.
Depois de uma ronda de apupos em Montemor-o-Velho, José Sócrates foi vaiado com grande vigor na Covilhã, no dia em que foi visitar a escola que frequentou quando era moço de bibe. Ao princípio, Sócrates ainda pensou que aquela gente toda estivesse a protestar, pelo facto, de o primeiro-ministro estar a fazer uma visita oficial e não ter cortado a praça principal da cidade para uma horinha de jogging. Afinal, o que tem a Covilhã a menos do que Washington ou o Kremlin? Mas, não, para horror e consternação de José Sócrates aquela gente não estava ali para lhe ver as pernocas bem torneadas... aquela malta vinha ali dizer-lhe uma ou duas das boas. Sabemos que é difícil de encarar mas há uma data de pessoas que não o acham “lindo”.
Entendemos o espanto de José Sócrates ao ser recebido com protestos. Ele está habituado a pagar para ter aqueles miúdos que sobram dos castings dos Morangos com Açúcar a recebê-lo com vivas e a dizer muito bem dos computadores novos que acabaram de receber e assim. E, desta vez, saiu-lhe o elenco do Prision Break em fúria.
Da próxima, talvez seja melhor não mandar dois polícias às frente, para fazer as contratações do pessoal para a comitiva de boas vindas. Vá-se lá saber porquê, há pessoas que reagem mal quando vêem um cacetete – mesmo que disfarçado – e lhes dizem para estar de bico caladinho. Perdem a vontade de ir dizer coisas bonitas à passagem do primeiro-ministro... que é tão lindo!
José Sócrates mostrou-se muito admirado por ter sido recebido com tamanha violência e contestação pelos professores. Cá para nós, até foi uma recepção em conformidade com o ambiente a que os docentes estão habituados. No estado em que estão a maioria das escolas públicas e tendo em conta o que se passa nas salas de aulas, Sócrates até teve muita sorte em não ter sido recebido com naifas e pistolas e música hip-pop em altos berros.Teria sido tão mais certo, em vez de fazer uma visita no âmbito da iniciativa “Regresso às Aulas”, ter escolhido o programa “Escola Segura”. Faz todo o sentido que os professores se comportem conforme o que aprendem nas salas de aulas. O primeiro-ministro é que não se conforma com isso e faz questão de deixar bem claro que não tolera desaforos, porque “uma coisa é uma manifestação, outra coisa é um insulto”. Ora, nós sabemos todos muito bem que a palavra “insulto” tem um sentido muito lato lá no léxico do primeiro-ministro. E também sabemos o que é que acontece às pessoas que dizem umas coisas sobre Sócrates, mesmo que em forma de anedota. Portanto, como não queremos perder o nosso empregozinho não vamos aqui esticar mais a corda... Mas, há uma coisa que temos de dizer... quando o primeiro-ministro diz que “assim não vale porque as pessoas estão a confundir manifestações com insultos e isso é feio” está realmente a tentar dizer o quê? Se calhar, há uma coisa que temos de lhe explicar: quando as pessoas querem mostrar o seu desagrado, geralmente, não escolhem palavras doces ou elogiosas para com o seu interlocutor. Não costuma surtir efeito. Não está à espera que nas manifestações, as pessoas passem a gritar palavras de ordem como: “o senhor é muito fofinho e tem umas pernocas que faxavor, nós é que somos umas bestas e pedimos muita desculpa por estarmos descontentes e aqui a protestar.” É que uma coisa é uma manifestação, outra coisa é o que uma pessoa gosta de ouvir quando se está a ver ao espelho.