De Encontro ao Pára-Brisas - ABC da Droga
O império do Instituto da Droga e da Toxicodependência contra-ataca. Depois de, no ano passado, estes senhores nos terem oferecido panfletos em que aconselhavam os consumidores de cocaína a “alternar a narina”, dirigem-se agora a um target mais novo. Todos aqueles que ainda não snifam coca mas estão ansiosos para concluir o 6º ano e deixarem a heroína. Os miúdos têm agora à disposição um dicionário do calão e da droga, no site tu-alinhas.pt. É um verdadeiro Acordo Ortográfico da toxicodependência. João Goulão, director do instituto, já está habituado a chocar de frente com poderosos e temíveis grupos sociais. Da outra vez tinham sido as famílias numerosas, agora são as associações de pais. Aposto que se seguirão os Hammerskin. Os encarregados de educação estão chocados com este dicionário, porque o consideram quase um manual. Por dizer coisas como: “queimar é aquecer com o isqueiro a heroína ou cocaína, até fazer a bolha brilhante, cativante e vaporosa cujo fumo será inalada com a ajuda de uma nota”. Não me parece que isto se aproxime nada do livro técnico. Soa-me muito mais a poesia. Há também um partido político que já se solidarizou com esta luta. Escusado dizer que é o CDS PP, visto que uma das entradas do dicionário define “Betinho” como “aquele que não se droga. Conservador e desinteressante”, e a malta do partido popular defende que betinho é pessoa que usa mocassins, risca ao lado e pólos da Gant. Com o mesmo significado de betinho há também “cocó” ou “careta” – tudo malta que não consome droga e é considerada desprezível. Cá para nós é malta que viveu a adolescência nos anos 50, porque desde então que ninguém chama “careta” a ninguém. Eu aprendi muita coisa com este dicionário. Por exemplo que Extroversão é capacidade de comunicação ou que Xamanismo é o conjunto de práticas aplicadas, relacionadas com as concepções cosmogónicas e com um conhecimento experimental codificado. Arrisco-me a dizer que o autor do dicionário estava high on drugs quando escreveu isto. Explica também o que é menstruação, desidratação, enfim, com sorte até encontramos o significado da vida aqui. Uma coisa é certa – aprendemos uma nova língua. Vejam lá se percebem isto: Vou ter com o camelo para ele me baptizar. Ele dá-me o açúcar, depois vou dar um bacalhau e fumo uma cassete. Acabei de dizer: Vou ter com um correio internacional de droga para me iniciar na droga, ele dá-me heroína, depois vou injectá-la e fumo um charro. E ainda dizem que os miúdos não aprendem nada na escola. Saem de lá poliglotas, mesmo sem ir às aulas. Até porque diz aqui que falta é carência de droga e História é sinónimo de mentira, por isso não interessa mesmo frequentar aulas seja do que for.