Normalmente, quando perguntamos a um menino o que é que ele quer ser quando for grande, a resposta anda qualquer coisa entre “polícia”, “bombeiro” ou “homem das cavernas”. Tudo opções de carreira que pressupõem a sua dose de força, heroísmo e até perigo. Pois marquem as nossas palavras: vai ser uma questão de tempo até as criancinhas de cinco anos começarem a responder “quero ser agente da ASAE”.
A profissão está na moda e afirma-se constantemente como muito mais do que andar para aí a ver se as camisolas da feira têm mesmo um crocodilo da Lacoste ou se afinal aquilo é só um desenho de uma osga. É de tal ordem que esta semana até ficámos a saber que a malta da ASAE anda a ter treino militar, com direito a aulas dadas pelo SIS e por agentes das SWAT norte-americanas. Qualquer dia até têm aulas com o Bruce Willis sobre o que fazer se um meteorito estiver a vir de encontra a Terra enquanto dá Aerosmith como música de fundo.
Apostamos que António Nunes era rapaz para fumar uma charutada de contente só de pensar que Ben Afleck poderia ser contratado para fazer de director da ASAE.
A verdade é que a ASAE é já muito mais do que uma mera polícia de segurança e actividade económica. O futuro tratará de fazer dela uma autêntica polícia de costumes, como a do livro “1984”, que até vê o cidadão a fazer a sua ginástica matinal e o obriga a falar apenas com um vocabulário autorizado. Se isto continua assim, a ASAE vai acabar por controlar todos os detalhes da nossa vida. Um cartucho regulamentar de castanhas assadas de cada vez.
Não nos espantaríamos se um dia, ao acordar, déssemos de caras com um inspector a envolver-nos em plástico e a selar-nos com fita adesiva, com a desculpa de que não cumprimos os requisitos regulamentares como “pessoa”.
Parece mesmo que tudo o que foi criado com o propósito de servir o português incauto está a acabar por se virar contra ele, qual Medusa insatisfeita com a sua permanente. E não nos referimos apenas à ASAE. Falamos inclusivamente do Livro de Reclamações.
À partida, é um conceito com tudo para defender os interesses do cliente: é basicamente um caderninho onde nos podemos chibar forte e feio quando algo corre mal num restaurante. É uma espécie de Livro de Ponto onde podemos brincar aos professores e marcar faltas a vermelho àquele empregado que deixou cair caspa na nossa salada de rúcula.
Mas até já o bom e velho Livro de Reclamações nos falha. Esta semana, uma mulher de Matosinhos foi condenada a indemnizar a proprietária de um restaurante em 300 euros e ainda a pagar uma multa de 15 euros por dia, para remir uma pena de 75 dias de prisão. O facto de se ter queixado sonoramente do serviço e de ter exigido o Livro foi considerado pelo tribunal como um acto que colocou em causa o prestígio, crédito e confiança do estabelecimento.
O aviso, portanto, fica dado: não se metam com a restauração. Eles já andam stressadinhos que chegue com a nova lei do tabaco. Não precisam ainda de clientes chatos, sempre a pedir coisinhas e a querê-las feitas em condições. Da próxima vez que, por exemplo, nos aparecer um cabelo no esparguete à bolonhesa, vamos ficar caladinhos, comer o cabelo e ainda ir à cozinha dar os parabéns ao chefe pela sua opção por um champô com um sabor algo cítrico.