Esta semana, levámos de frente com uma gravação telefónica que encosta a um canto qualquer escuta, por mais chocante ou badalhoca que seja, e que vem demonstrar que isso do fecho das urgências até é “do mal, o menos”. Trata-se de uma comunicação entre o INEM e o quartel de Bombeiros de Favaios, em Alijó. E que a SIC reproduziu nos seus noticiários.
O caso começa com um pedido de socorro para o 112. No meio de alguma confusão, alguém pede ajuda por causa de um homem que estaria... morto. Percebe-se que a história vai correr mal quando o a pessoa que pede ajuda - neste caso o irmão da vítima, aparentando uma calma de quem ligou para aquele serviço que dá para ouvir as horas e acertar o relógio - diz à operadora que, em vez da ambulância, é melhor mas é mandar a guarda...
Que este senhor confunda quedas com doenças e tenha lapsos de raciocínio, até se compreende e mais do que justifica. Afinal, está a comunicar a morte do irmão. O que já não se compreende é que, quando se tinha de passar à acção, a pessoa responsável por sair em socorro, tenha confundido “urgência” com “dormir a sesta”. Depois, da operadora do INEM ter explicado durante um bom bocado tempo a ocorrência, o pobre do bombeiro responde desta forma pronta e expedita: Bastante lixada, minha senhora! E a sorte do outro senhor foi já estar morto, pois, com tamanha prontidão e destreza de acção, se ele não estivesse já a conversar com os anjinhos, depressa lá chegaria. E então, lixado estaria ele. O pior é que a história não se fica por aqui. Depois de mais umas chamadas, a operadora do INEM põem o quartel de Favaios em contacto com Vila Real, para que se possam dar indicações de caminho a uma viatura médica que deveria ir, também, ao local do acidente. E nesta altura, o ponto da situação é o seguinte: ambulância parada, carro médico parado, muita conversa em ritmo lento... homem morto nas escadas. Há uma data de tempo. E quando parece que está tudo pronto, finalmente, para seguir em auxílio da vítima, Favaios volta a surpreender com esta tirada: “Estou sozinho”.
Uma simples desabado e nunca a solidão teve uma expressão tão trágica. Está sozinho o bombeiro, e estamos todos nós, que se cairmos de uma escada, não temos melhor para nos ajudar do que um homezinho, mais aflito ainda que nós, que mal sabe como se atende um telefone, quanto mais conduzir uma ambulância. Soubesse ele o que sabe hoje, nunca tinha este pobre bombeiro atendido o raio do telefone. Tinha ficado a dormir mais uma soneca e a sonhar com os gatinhos que iria salvar de cima da árvore, pois, foi para isso que ele ali foi posto de certeza. Está o pais inteiro de pantanas por causa das urgências encerradas. Ora, quer-nos a nós parecer que bem pior são estes quartéis de bombeiros, que estão abertos, mas só por fora. Por dentro estão fechados e bem fechados. De qualquer maneira, aqui fica o nosso conselho: se o estimado ouvinte se encontrar em apuros, em vez de ligar o 112, ligue para os táxis. Mesmo que o taxista faça o caminho mais longo e tenha de passar por Beja para ir de Coimbra A a Coimbra B, tem de certeza mais chances de chegar vivinho, ou pelo menos sem danos irreversíveis, a um hospital que esteja aberto.